Prostatite Crônica

(Dor Perineal em Homens)

Por Dr. Paulo Rodrigues

Uma das dificuldades nos pacientes que apresentam dor pélvica é a postura reservada dos ginecologistas quanto ao diagnóstico de Cistite Intersticial, que embora inclusa no diagnóstico diferencial, raramente é diagnosticada claramente.

Como o sintoma dominante pode ser dor, embora associada à outras apresentações urológicas, tais como ardor para urinar, aumento da freqüência miccional diurna e noturna, muitas destas pacientes têm a dor relacioanada à esfera ginecológica, sendo tratada como  corrimento vaginal de difícil controle, endometriose, vestibulite vaginal ou vulvodínea. Uma vez rotulado como condição ginecológica, todas as manobras diagnósticas e terapêuticas serão direcionadas para a ginecologia, muitas vezes atrasando enormemente a correta proposta terapêutica, que como mencionado estaria relacionada à bexiga.

A doença é insidiosa e progressiva e denota um elemento contínuo de progressão, determinado pela ativação neuronal irregular, mas que em muitos casos, permanecem em estado intermediário, sem alcançar todos os requisitos básico par o diagnóstico de Cistite Interstiticial. Assim muitos casos não alcançam 15 micções/dia, mas ficam num estado intermediário de 8 a 12x/dia, passando a constituir a normalidade daquela pessoa.

Numa avaliação mais pragmática encontra-se teste de potássio (+) em até 90% dos casos de dor pélvica, revelando que muitos dos casos de dor pélvica, na verdade constituem em casos de disfunções vesicais, com perda da camada de muco na bexiga.

Como o cruzamento de vias neurológicas na pelve é bastante grande e complexo, formando inúmeras vias de trânsito neuronal, reconheceu-se recentemente, que muitos neurônios destinados inervar a bexiga, também inervam o cólon (intestino grosso), útero, ânus e reto, assim como próstata e esfíncter uretral, significando que algumas das dores na pelve podem ter origem num órgão, mas se manifestarem clinicamente em outro, ‘enganando” o cérebro, o paciente e até mesmo o cirurgião.

Verificou-se em estudos das vias neuronais que 55% dos nervos da bexiga, vão também para o cólon, 35% para o útero e 45% para a musculatura do assoalho pélvico, sendo o inverso também verdade.

Prostatites Crônicas, Prostatodínias e Dores Pélvicas em Homens

A dor pélvica em homens, anteriormente conhecida como prostatite crônica ou prostatodínia, é uma condição que se associa a qualquer dor de difícil controle ou tratamento por pelo menos 3 meses, ou que recorre em surtos envolvendo o sistema gênito-urinário, quando se está urinando ou não, mas na ausência de bactérias ou outros quaisquer uro-patógenos.

A prevalência desta situação na população masculina é de cerca de 2,2%.

Outras condições que confundem a nomenclatura da doença incluem dor escrotal, protalgia fugax, dor pélvica muscular e neuralgia pudenda.

Ainda não se sabe ao certo a origem desta condição, mas se reconhece que ela advém da numerosa distribuição de nervos na pelve, muitas vezes espalhando-se para mais de um órgão, o que faz com que a identificação do local e ponto da dor seja difícil de precisar.

Como a origem da dor na pélvis é diversa, reconhece-se que muitos casos têm também doenças dolorosas mais conhecidas, o que demonstra que alguns pacientes apresentam sistema nervoso mais instável e propenso às condições de instabilidade neuronal relacionadas a dor crônica. Assim, verifica-se que 35% dos homens com dor pélvica crônica apresentam também fibromialgia, síndrome da fatiga crônica e síndrome do cólon irritável.

Alterações intestinais, mais comumente aumentos da freqüência de evacuações (3 a 6 vezes por dia) ou mesmo diarréia, ou proctalgia fugax, que consiste em espasmos da musculatura do reto, ânus ou períneo que duram segundos ou horas, são freqüentemente vistos nestes pacientes.

Neste grupo de pessoas, acha-se aumento do tônus da musculatura do assoalho pélvico em 50 a 70% dos casos, com atividade muscular aumentada, isto é, mais contraída, piorando o jato urinário que se torna mais fraco, ao mesmo tempo que se torna mais difícil a evacuação e relações sexuais, com ejaculação e orgasmos menos prazerosos. Como tais sintomas ampliam o desconforto, isto pode levar a mais contratura muscular gerando um círculo vicioso de dor e mais espasmo contrátil.

Tendo em vista a variação da apresentação dos sintomas de dor p´levica crônica, recomenda-se que se a divida em regiões ou domínios de apresentação, tais como urinário, intestinal, psico-sosical, infeccioso, espástico ou de disfunção neurológica.

Estes fenótipos de apresentação da dor podem ser distintos através da história médica, exame físico minucioso e exames tais como cultura do fluido prostático, fluxometria livre ou estudo urodinâmico e cistoscopia.

Esta melhor divisão e entendimento da dor pélvica embasa a mudança na nomenclatura de prostatite crônica para síndrome da dor pélvica crônica – CP-CPPS- Chronic prostatitis/chronic pelvic pain syndrome.

O evento iniciador do processo não é bem compreendido, mas todo o círculo vicioso e de sustentação pode se iniciar com trauma, abuso sexual, relação sexual dolorosa, infecções urinárias, etc. Tais eventos, causadores de evento agudo de dor, podem desestabilizar as rotas neuronais de dor e cronificando-nas e transformando uma dor originalmente aguda em crônica. A conversão de dor aguda em crônica começa pela ativação de fibras neuronais viscerais adormecidas não-mielinizadas do tipo C, que se estimulam por estímulos prolongados, ativando-as.

Os neurônios do corno medular posterior são despertados, causando respostas exageradas chamadas de hiperalgesia. Após algum tempo, esta resposta exagerada estende-se também a estímulos não dolorosos, que passam AA ser percebidos como estímulos dolorosos; tal como bexiga cheia ou fezes ou gazes no reto, chamado de alodínia. O neuro-transmissor chamado de Substância P estimula a liberação exagerada de histamina e óxido nítrico pelos neurônios e mastócitos da mucosa e submucosa do reto e da bexiga promovendo dor.

Cerca de 88% dos homens com dor pélvica apresentam aumento do tônus muscular pélvico, associado à incapacidade voluntária de contração deste grupo muscular, o que demonstra a dificuldade em identificá-los de maneira apropriada e adaptá-los às necessidades fisiológica. Tal verificação demonstra que faltando atividade neuronal voluntária neste grupamento muscular, motiva contrações musculares involuntárias, que sustentam e realimentam o ciclo perpetuante de aumento do espasmo.

Esta espasticidade aumentada do assoalho pélvico estende-se para o esfíncter uretral promovendo alterações na forma de urinar; muitas vezes reproduzindo sintomas urinários semelhantes à obstrução prostática.

Estudos urodinâmicos desta população demonstra incoordenação esfincteriana levando a falsa impressão de que a glândula prostática esteja envolvida, quando na verdade é apenas um elemento reativo ao processo.

Infelizmente, alguns pacientes podem até mesmo serem operados inadvertidamente, se o diagnóstico for imperfeito.

O aumento do tônus muscular do assoalho pélvico, já foi verificado por vários autores médicos, assim como uma hiper-excitabilidade dos neurônios do corno posterior da medula espinhal, através de testes de sensibilidade neuronal e velocidade de condução nervosa. A hiper-excitabilidade nervosa nestes indivíduos possivelmente está associada ao aumento da atividade autonômica simpática, talvez explicando inclusive porque alguns destes indivíduos têm traços de personalidade mais ansiosa.

Ao se encontrar em 47% dos indivíduos com dor pélvica crônica, uma proporção maior de musculatura lisa no assoalho pélvico, entende-se como um aumento da atividade neuronal simpática e conseqüentemente muscular nestes indivíduos, promovem aumento da contratura muscular.

Ademais, por extensão, entende-se como tais indivíduos, com traços de personalidade mais ansiosa, que refletem um aumento da atividade autonômica simpática, são mais frequentemente acometidos por esta doença.

Similarmente, pacientes com cefaléia recorrente, também apresentam traços de personalidade ansiosos, e atividade simpatia aumentada, podendo ter seus sintomas diminuídos com a utilização de alfa-bloqueadores, que as diminuem.

A descoberta de que o aumento da tensão muscular é a origem da dor pélvica, leva à necessidade de tratamento multi-modal, com a finalidade de relaxar os pontos de excitabilidade muscular. Utilizando-se de fisioterapia, medicamentos específicos, após um diagnóstico apropriado, pode levar a resposta clínica satisfatória em até 70% dos casos, mesmo em casos que longo tempo de apresentação, embora o tratamento possa exigir estrita aderência e paciência.

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